segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Michelangelo: Do Renascimento à Revolução

Os gênios do renascimento estavam conscientes da revolução que estavam provocando com suas artes na Europa e no mundo ao fim da Idade Média e advento dos Tempos Modernos. Estavam atentos às transformações científicas que ocorriam e em como elas mudavam o dia-a-dia das pessoas. As novas concepções do mundo e do universo contrapunham os avanços científicos às crenças de parte da Igreja, agarrada ainda ao mundo medieval. Ela tinha dificuldades tanto em aceitar as coisas novas como em abandonar as antigas.
O planeta deixava de ser plano, como se entendia, e passava a ser redondo, o que abria imensas extensões a serem conquistadas – até mesmo uma viagem de circunavegação poderia ser feita. Até então, pouca gente acreditava que se poderia chegar ao nascente navegando em direção ao poente.
A sociedade do Renascimento estava mergulhada num turbilhão de novas concepções, motivadas em parte pela substituição do conhecimento dogmático pelo científico. Os estudiosos queriam medir, comparar, dissecar, desenhar, cheirar, elaborar novas teorias e avançar pelas fronteiras do conhecimento onde seus antepassados não ousaram.
A burguesia sustentava a maioria dos artistas do Renascimento Italiano. Os gênios eram contratados para trabalhos de arte, e muitos se apoiavam nos mecenas. O ato de investir na arte estava longe de ser uma ação de benemerência ou de puro amor à arte que produziam. Era um investimento. Uma confluência de interesses econômicos com o prazer de viver próximo a obras tão extraordinárias.
Michelangelo viveu em uma época mágica onde grandes transformações mudaram a face, primeiro da sociedade européia, depois do mundo, em um período de aceleração histórico.
Surgia o gênio que por traz da grande máscara negra embutida pelo cristianismo, a fim de impor uma barreira entre conhecimento e ciência, veio a conceber para toda a humanidade sua crítica, hoje em dia exposta, de uma época que o corpo humano era tratado de uma forma tão sagrada que era inviolável.
Convocado para emplacar nas paredes da Capela Sistina a imagem que a Igreja Católica queria implantar na humanidade, o gênio nos concebeu um dos enigmas mais conhecidos no mundo, transformando a anatomia humana em obras de artes. Uma forma clara de crítica a um sistema que impôs proibição à dissecação de corpos humanos para estudos para a ciência e avanço da mesma.
O enigma é um dos elementos transcendentais responsáveis pela perenidade da obra e pelo desprezo que ela tem com o tempo. O enigma não se resolve nunca porque muda de acordo com a visão dos homens e em cada época é interpretado de uma maneira e,quanto mais passa o tempo, mais polêmico se produz, por isso ele não se resolve nunca.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Introdução à História da Anatomia Humana

A anatomia humana é uma ciência dinâmica e em desenvolvimento com uma longa e excitante herança. Ela continua propiciando os fundamentos para as pesquisas médicas, bioquímicas, citogenéticas e biomecânicas.
É a ciência que se dedica à estrutura do corpo humano. O termo anatomia deriva da palavra grega que significa “cortar em partes”, e o termo fisiologia deriva de “o estudo da natureza”.
A maioria dos termos que formam a linguagem anatômica são de procedência grega ou latim. Latim era a língua do Império Romano, época em que o interesse das descrições científicas foi cultivado. Com o declínio do Império Romano, a língua latina foi se tornando “língua morta”, mas manteve seu valor na nomenclatura porque permaneceu inalterada ao longo da história.
Embora Gregos e Romanos tenham efetuado significante contribuição à terminologia anatômica, deve ser lembrado que muitos indivíduos de outras culturas também contribuíram para a ciência anatômica da humanidade.

Anatomia na Mesopotâmia e Egito

O Período científico começa com os registros de observações anatômicas feitas na antiga Mesopotâmia cerca de 3.000 anos atrás em blocos de argila e em escrita cuneiforme e continua até nossos dias. Obviamente, todas as contribuições do passado para a ciência da anatomia não podem ser mencionadas; porém, certos indivíduos e culturas tiveram um importante impacto e serão rapidamente comentados nesse site.
A história da Anatomia apresenta um interesse paralelismo com a história da dissecação de cadáveres humanos.
Mesopotâmia era o nome dado à longa e estreita cunha de terra entre os rios Tigre e Eufrantes que atualmente é uma grande parte do Iraque. Escavações arqueológicas e registros antigos demonstram que está área já era povoada antes de 4000 a.C.
Com base nas informações registradas sobre a cultura do povo, a Mesopotâmia é chamada freqüentemente de O BERÇO DA CIVILIZAÇÃO.
Inicialmente, muitas investigações sobre o corpo representavam uma tentativa para descrever as forças básicas da vida. Por exemplo, as pessoas desejavam saber qual órgão constituía a alma.
Alguns escritos cuneiformes da Mesopotâmia antiga descreviam órgãos do corpo que, segundo se pensava, serviam para esta função.
O fígado, que foi exaustivamente estudado em animais sacrificados, era o guardião da alma e dos sentimentos que nos fazem homens. Esta era uma suposição lógica por causa, que era considerado essencial para a vida. Ainda hoje, algumas culturas européias associam o fígado com várias emoções.
A antiga cultura egípcia desenvolveu-se a oeste da Mesopotâmia, onde foi aperfeiçoada a sofisticada ciência do embalsamamento dos mortos na forma de múmias. Nenhuma tentativa conhecida era feita para realizar estudos anatômicos ou patológicos nos cadáveres, já que embalsamar era estritamente um ritual religioso reservado para a realeza e para os ricos a fim de prepara-los para uma vida depois da morte.
Foram descobertos vários trabalhos escritos sobre a anatomia do Egito antigo, mas nenhum deles influenciou as culturas que os sucederam. Menes, médico rei durante a primeira dinastia egípcia cerca de 3400 a.C. (Até mesmo antes das pirâmides terem sido construídas), escreveu o que é considerado o primeiro manual em anatomia. Escritas posteriores (2300-1250 a.C.) tentaram uma sistematização do corpo, iniciando pela cabeça e continuando no sentido descendente.

Anatomia no Período Grego

Foi na Grécia antiga que a anatomia, inicialmente , ganhou maior aceitação como ciência. As escritas de vários filósofos gregos tiveram um forte impacto no pensamento científico futuro. Durante este período, os gregos ficaram obcecados com a beleza física do corpo humano, o que se refletiu nas suas primorosas esculturas.
Os jovens gregos eram estimulados a ser atléticos e desenvolver as suas capacidades físicas, mas em torno de 18 anos de idade eram orientados mais para a atividades intelectuais da ciência, da retórica e da filosofia. Esperava-se que durante o processo educacional, o indivíduo recebesse orientação em todos os campos do conhecimento, e era natural que grandes e largos passos fossem dados nas ciências.
Talvez a primeira referência escrita sobre a anatomia das feridas ocorridas em batalhas seja aquela citada na Ilíada, escrita por Homero, aproximadamente 800 a.C.
As descrições detalhadas de Homero da anatomia das feridas eram sumamente precisas. Contudo, ele descreveu feridas claramente definidas – não os tipos de feridas traumáticas que deveriam, provavelmente, ser encontradas em um campo de batalha. Isso levou à especulação que dissecações humanas já eram feitas durante este período e que as estruturas anatômicas já eram bem conhecidas. Vítimas de sacrifício humano podem ter servido como material para estudo e demonstração anatômica.

Hipócrates

Hipócrates (460-377 a.C.) o mais famoso médico grego do seu tempo, é considerado o pai da medicina por causa dos princípios éticos de prática médica que sua escola estabeleceu, e seu nome é imortalizado no juramento Hipocrático que muitos estudantes, ao se formarem em medicina, repetem como compromisso de exercício profissional e dever perante a humanidade.
Hipócrates, provavelmente, tinha apenas limitada orientação em dissecações humanas, mas foi bem disciplinado na popular teoria humoral de organização do corpo.
Através dessa tória eram reconhecidos quatro humores no corpo, e cada um deles era associado com um órgão em particular: sangue com fígado; cólera, ou bile amarela com vesícula biliar; fleuma com pulmões; e melancolia, ou bile preta com o baço. Imaginava-se que uma pessoa com saúde teria um equilíbrio dos quatro humores. O conceito dos humores há muito tempo foi abandonado, mas dominou o pensamento médico durante mais de 2.000 anos.
Os quatro humores fazem parte de nosso vocabulário e da prática médica ainda hoje, Melancolina é um termo usado para descrever depressão ou desânimo em uma pessoa, enquanto melano se refere a uma aparência obscura ou pálida. O prefixo melano significa preto. Cólera é uma doença intestinal infecciossa que causa diarréia e vômito. Fleuma no interior do sistema respiratório é sintomático de várias doenças pulmonares.
Talvez a maior contribuição de Hipócrates tenha sido a de ter atribuído causas naturais às doenças em lugar da desaprovação dos Deuses. Sua aplicação da lógica e da razão na medicina foi o começo da medicina de observação.

Aristóteles

Aristóteles (384-322 a.C.), um discípulo de Platão, era escritor consumado, filósofo e zoologista. Era também professor renomado, contratado pelo Rei Filipe da Macedônia para ensinar seu filho, Alexandre, que depois ficou conhecido como Alexandre, o Grande.
Aristóteles fez investigações cuidadosas em todos os tipos de animais incluindo referências aos humanos, e seguia um tipo limitado de métodos científicos na obtenção de dados. Escreveu o primeiro relato conhecido de embriologia no qual descreveu o desenvolvimento do coração em um embrião de galinha. Denominou a artéria aorta e diferenciou as artérias das veias.
As obras zoológicas mais conhecidas de Aristóteles são “História dos animais”, “Das Partes dos animais” e “Da geração dos Animais”. Esses livros tiveram uma profunda influência no estabelecimento e na especialidade dentro da anatomia, e granjearam a Aristóteles o reconhecimento como o fundador da anatomia comparada.
Apesar de suas extraordinárias realizações, Aristóteles perpetuou algumas teorias erradas relativas à anatomia. Por exemplo, a doutrina dos humores constituía os limites do seu pensamento. Platão tinha descrito o cérebro como “assento do sentimento e do pensamento”, mas Aristóteles discordou. Ele colocou a sede da inteligência no coração e comentou que a função do cérebro, que era banhado em líquido, era esfriar o sangue que tinha sido bombeado pelo coração mantendo assim a temperatura do corpo.

Anatomia no Período Alexandrino

Alexandre, o Grande, fundou Alexandria em 332 a.C. e a fez capital do Egito e um centro de aprendizado. Além de uma grande biblioteca, havia também uma escola de medicina em Alexandria.
O estudo da anatomia floresceu porque eram admitidas as dissecações de cadáveres humanos e vivissecções de humanos (dissecação de seres vivos). Este procedimento brutal era executado comumente em criminosos condenados, sob o argumento de que a melhor forma de compreender as funções do corpo seria estudá-las enquanto o indivíduo estivesse vivo, e que um homem condenado poderia retribuir melhor a sociedade através da utilização do seu corpo para uma vivissecção científica.
Infelizmente, as contribuições eruditas e o desenvolvimento científico de Alexandria não penduraram. A maioria dos trabalhos escritos foi destruída quando a grande biblioteca foi queimada pelos romanos ao conquistarem a cidade em 30 a.C.
O que se sabe sobre Alexandria dói obtido através das escritas dos últimos filósofos, cientistas e historiadores, inclusive Plínio, Celsus, Galeno e Tertuliano. Dois homens da Alexandria, Herófilo e Erasistrato, fizeram as contribuições mais duradouras para o estudo da anatomia.

Herófilo

Herófilo (aproximadamente 325 a.C.) foi preparado na escola Hipocrática mas se tornou grande professor de anatomia em Alexandria. Através de vivissecções e dissecções de cadáveres humanos, ele apresentou descrições excelentes do crânio, olho, vários órgãos e as relações funcionais da medula espinal com o cérebro. Duas obras monumentais de Herófilo são chamadas “Sobre a anatomia” e “Dos Olhos”. Ele considerava o cérebro como a sede da inteligência e descreveu muitas de suas estruturas, como as meninges, o encéfalo, o cerebelo e o quarto ventrículo, e foi também o primeiro a distinguir nervos sensitivos e motores.

Erasistrato

Erasistrato (aporximadamente 300 a.C.) interessava-se mais pelas funções do corpo do que pela estrutura e freqüentemente é chamado o pai da fisiologia. Em um livro sobre as causas das doenças, ele incluiu observações sobre o coração, os vaso, o encéfalo e os nervos cranianos. Erasistrato observou os efeitos tóxicos do veneno de serpente em vários órgãos viscerais e descreveu alterações no fígado resultantes de várias doenças. Embora algumas de suas escritas fossem cientificamente precisas, ele também teve noções primitivas e místicas. Por exemplo, pensou que os nervos cranianos conduziam espíritos animais e que os músculos se contraíam porque eram distendidos pelos espíritos, que o ventrículo esquerdo do coração estava cheio com um espírito de ar vital (pneuma) que entrava nos pulmões e que as artérias transportavam este pneuma em lugar de sangue. Quase...

Herófilo e Erasistrato foram muito criticados historicamente pelas vivissecções que executaram. Celsus e Tertuliano, eram particularmente críticos da prática de vivissecção. Herófilo, às vezes, era citado como um açougueiro de homens que dissecou mais de 600 seres humanos vivos, muitas vezes em demonstrações públicas.

Anatomia no Período Romano

Em muitos aspectos, o Império Romano abafou os avanços científicos e preparou as bases para a Idade do Obscurantismo (Idade Média). A abordagem científica substituiu a teoria pela prática durante esse período. Foram realizadas algumas dissecações de cadáveres visando mais determinar a causa da morte em caso criminais. A medicina não era preventiva mas limitava-se, quase sem exceção, aos tratamento de soldados feridos em batalhas. Nos últimos tempos da história romana, as leis eram estabelecidas atestando a influência da Igreja na prática médica. De acordo co ma lei romana, pro exemplo, nenhuma mulher grávida falecida poderia ser enterrada sem remoção anterior do feto do útero de forma que pudesse ser batizado.
Os documentos científicos que foram preservados do Império Romano são principalmente compilações de informações obtidas dos estudiosos gregos e egípcios. Informações anatômicas novas eram escassas, e em sua maior parte se referiam mais as dissecações de animais do que de seres humanos. Dois anatomistas romanos importantíssimos foram Celsus e Galeno.

Celsus

A maior parte do que se conhece, atualmente, sobre a escola médica de Alexandria baseia-se nas escritas do enciclopedista romano Cornelius Celsus (30 a.C. – 30 d.C.). Ele compilou estas informações em um trabalho de oito volumes chamado “ Dere medicina”. Contudo, Celsus teve influência apenas limitada em seu próprio tempo, provavelmente por causa do uso do latim em lugar do grego. O enorme valor de sua contribuição não foi reconhecido até o Renascimento.

Galeno

Claudius Galeno (130-201 d.C.) foi talvez o melhor médico desde Hipócrates. Um grego que viveu sob a dominação romana, foi certamente o escritor mais influente de todos os tempos em assuntos médicos. Durante quase 1500 anos, as escritas de Galeno representaram a maior autoridade na anatomia e no tratamento médico. Galeno, provavelmente, não dissecou mais do que dois ou três cadáveres humanos durante toda a sua existência, o que forçosamente limitou suas descrições anatômicas em dissecações de animais e não em seres humanos. Ele compilou quase 500 documentos médicos (dos quais 83 foram preservados) desde obras antigas de outros autores como também de seus próprios estudos pessoais, e perpetuou o conceito dos humores do corpo e deu explicações abalizadas em quase todas as funções do corpo.
As obras de Galeno contêm muitos erros, principalmente por causa de sua vontade em querer tirar conclusões definitivas relativas sobre as funções do corpo humano baseando-se em dados obtidos em sua maior parte de animais como macacos, porcos e cachorros. Ele demonstrou, porém, alguns detalhes anatômicos interessantes e precisos que ainda são considerados estudos clássicos. Provou ser um experimentalista, demonstrando que o coração de um porco continuava batendo quando os nervos espinais eram seccionados de forma que os impulsos nervosos poderiam não alcançar o coração; e mostrou que os guinchos de um porco cessavam quando o nervo laríngeo recorrente que inervava as pregas vocais eram seccionados.
Galeno também amarrou o ureter de uma ovelha provando que a urina era proveniente dos rins e não da bexiga, como se afirmava erradamente.
Além disso, constatou que as artérias continham sangue em lugar de ar.
Galeno compilou uma lista de muitas plantas medicinais e medicamentos usados extensivamente para tratar enfermidades.
Era também um forte defensor de auxiliar a saúde natural com boa higiene, dieta adequada, repouso e exercícios.

Anatomia na Idade Média

A Idade Média, freqüentemente chamada de Idade do Obscurantismo, começava com a queda de Roma para os godos em 476 d.C. e durou quase 1000 anos até Constantinopla ser conquistada pelos turcos em 1453. A Igreja Cristã totalitária suprimiu a ciência e estagnou as atividades médicas. A existência humana continuou sendo miseravelmente precária, e as pessoas já não se sentiam capazes de aprender a partir de observações pessoais. Bastava aceitar a “vida na fé”. Sem avanços medicinas para cura de doenças, nessa época um simples resfriado matava!
A dissecação de cadáveres foi totalmente proibida durante este período e a violação de cadáver era considerada um ato criminoso, freqüentemente punindo o violador com uma condenação à fogueira e amarrado a uma estaca.
Se ocorresse mortes misteriosas, os exames por inspeção e palpação eram aceitos. Durante a peste epidêmica no século XVI, porém, foram realizadas algumas necropsias e dissecações na esperança de determinar a causa desta temível doença.
Durante as Cruzadas, os soldados cozinhavam os ossos dos seus companheiros mortos em combate de modo que eles pudessem retornar para suas casas, para um enterro formal. Porém, até mesmo este ato foi considerado um sacrilégio e rigorosamente condenado pela Igreja Cristã.
Um contra-senso da Idade Média, já que os camponeses eram menos respeitados e tinham menos direitos enquanto estavam vivos do que quando estavam mortos.

Anatomia no Islame

Os povos da língua árabe deram profundas contribuições à historiada anatomia de um modo mais incomum. Foi o mundo islâmico que salvou grande parte da cultura ocidental das ruínas do Império Romano, da opressão da Igreja Cristã e das perseguições da Idade Média. Com a expansão pelo Oriente Médio e Norte da África durante o século VIII, foram levados de volta os manuscritos sobreviventes de Alexandria para os países árabes onde foram traduzidos do grego para o árabe.
Quando a idade do Obscurantismo dominava a Europa, a Igreja Cristã procurou abafar qualquer manifestação cultural ou conhecimento mundano que não fosse admitidos pelos dogmas cristãs. O estudo do corpo humano foi considerado herético, e a Igreja proibiu as escritas sobre anatomia. Sem a preservação islâmica das escritas de Aristóteles, Hipócrates, Galeno e outros, o progresso de séculos em anatomia e medicina estaria perdido.
Somente no século XII as traduções arábicas retornaram à Europa e, por sua vez, foram traduzidas para o latim. Durante o progresso de tradução, qualquer terminologia árabe que tinha sido introduzida foi retirada sistematicamente, de forma que hoje nós achamos poucos termos anatômicos de origem árabe.

Anatomia no Renascimento

O período conhecido com Renascimento foi caracterizado pelo renascimento da ciência. Estende-se aproximadamente do século XIV ao XVI e foi um período de transição entre a idade Média e a idade moderna da ciência.
O Renascimento foi introduzido nas grandes universidades européias estabelecidas em Bolonha, Salermo, Pádua, Montpeiller e Paris.
A primeira dissecação humana registrada nestes centros de aprendizado recém-estabelecidos foi a obra do cirurgião William de Saliceto (1215 – 1280) da Universidade de Bolonha. O estudo da anatomia humana difundiu-se rapidamente pelas outras universidades e pelo ano de 1300, as dissecações humanas tinham se tornado parte integrante do currículo médico. Porém, o dogma Galênico de que a anatomia humana normal era suficientemente conhecida persistia e, assim, o interesse nesse tempo centralizava-se em métodos e técnicas de dissecação em lugar de avançar no conhecimento do corpo humano.
O desenvolvimento da imprensa com os tipos removíveis em torno de 1450 revolucionou a produção de livros. Celsus cujo De re medicina foi “redescoberto” durante o Renascimento, foi o primeiro autor médico a ser publicado dessa maneira. Entre os primeiros livros de anatomia a serem impressos em tipos removíveis estava o de Jacopo Berengario de Carpi, professor de cirurgia em Bolonha. Ele descreveu muitas estruturas anatômicas, inclusive o apêndice, o timo e a laringe. O texto mais influente desse período foi escrito por Mondino de’ Luzzi, também da Universidade de Bolonha, em 1316. Publicado inicialmente em 1487, era mais um guia de dissecação do que um estudo de anatomia macroscópica e, apesar de seus numerosos erros galênicos, até o tempo de Versalius.
Por cauda da rápida putrefação de um cadáver não embalsamado, os livros de anatomia do início do Renascimento eram organizados de moda que as porções mais perecíveis do corpo fossem descritas inicialmente. As dissecações começavam pela cavidade abdominal, a seguir o tórax, seguindo da cabeça e finalmente os membros. Uma dissecação era uma verdadeira maratona que freqüentemente se prolongava durante 4 dias.
Com o aumento pelo interesse na anatomia humana durante o Renascimento, a obtenção de cadáveres para dissecação tornou-se um problema sério. Estudantes de medicina praticavam regularmente a violação de sepulturas para rouba-los até que finalmente um decreto oficial emitido permitiu usar os corpos de criminosos executados como espécimes.
Os cadáveres eram embalsamados para prevenir a deterioração, mas o processo ainda não era especialmente eficiente, e o cheiro dos cadáveres em decomposição ainda persistia. Os professores de anatomia proferiam suas aulas de cátedras um pouco distantes do local do corpo. A frase “Eu não devo toca-lo com uma vara de 10 pés” provavelmente originou-se durante esse tempo em referência ao cheiro de um cadáver em decomposição.
Os principais avanços em anatomia ocorridos durante o renascimento foram, em grande parte, decorrentes das habilidades artísticas e científicas de Leonardo Da Vinci e Andréas Vesalius.
Trabalhando nos séculos XV e XVI, cada um deles produziu estudos monumentais da forma humana.

Da Vinci

O grande renascentista italiano Leonardo Da Vinci (1452-1519) é mais conhecido pelas suas obras artísticas e suas contribuições científicas. Ele demonstrou a sua genealidade como pintos, escultor, arquiteto, músico e anatomista, embora os seus desenhos anatômicos não tivessem sido publicados até o fim do século XIX. Quando jovem, Leonardo participava regularmente de dissecações de cadáveres e pretendia publicar um texto de anatomia com o professor de Pavia Marcantonio della Torre. A morte prematura de della Torre na idade de 31 anos suspendeu seus planos.
Quando Da Vinci morreu, suas notas e esboços se perderam e não foram descobertos por mais de 200 anos. O progresso da anatomia teria sido antecipado por muito anos se os cadernos de Leonardo estivessem acessíveis para o mundo na época de sua morte.


Vesalius

A contribuição de Andréa Vesalius (1514-1564) para a ciência da anatomia humana e para a medicina moderna é imensurável.
Vesalius nasceu em uma família de médicos de Bruxelas. Ele recebeu seu aprendizado médico inicialmente na Universidade de Pádua, na Itália, onde começou a lecionar cirurgia e anatomia imediatamente após sua graduação. Em Pádua, Vesalius participou de dissecações humanas e iniciou o uso de modelos vivos para determinar os pontos de reparo em anatomia de superfície para estruturas internas.
Vesalius aparentemente tinha enorme disposição e ambição. Aos 28 anos de idade, já tinha completado sua obra-prima, De Humani Corporis Fabrica, na qual os vários sistemas do corpo e órgãos isolados são belissimamente ilustrados e descritos. Seu livro foi especialmente importante porque desafiou corajosamente os ensinamentos seculares de Galeno. Vesalius manifestou sua surpresa ao encontrar numerosos erros anatômicos nas obras de Galeno e que eram ensinados como fatos, e recusou-se a aceitar as explicações de Galeno pela fé. Como ele era tão declaradamente contrário a Galeno, despertou a raiva em muitos anatomistas tradicionalistas, inclusive de seu professor Sylvius de Paris. Sylvius até mesmo foi mais além, dando-lhe o apelido de “Vesalius o louco” .
Vesalius ficou tão nervoso pelos ataques implacáveis que destruiu muito de suas obras inéditas e parou de dissecar.

Anatomia no Século XVII e XVIII

Durante os séculos XVII e XVIII ,a anatomia atingiu uma aceitação inigualável. Em alguns aspectos, assumiu também uma qualidade um pouco teatral. Anfiteatros primorosos eram construídos em várias partes da Europa para demonstrações públicas de dissecações humanas. Ingressos de admissão eram vendidos a preços exorbitantes, e as dissecções eram executadas por anatomistas elegantemente vestidos e que também eram esplêndidos oradores. Os cadáveres eram, em geral, de prisioneiros executados e as exibições eram marcadas durante o tempo frio por causa da natureza perecível do cadáveres.
Felizmente, também existiam anatomistas sérios, cientistas notáveis que fizeram significantes contribuições durante este período. Duas das contribuições mais importantes foram a explicação da circulação sangüínea e o desenvolvimento do microscópio.

Harvey

Em 1.628, o médico inglês William Harvey (1578 – 1657) publicou sua obra pioneira sobre o Movimento do Coração e do Sangue nos Animais.
Não apenas fez esta pesquisa brilhante provando a circulação contínua do sangue contido no interior de artérias e veias, como também demonstrou um exemplo clássico do método científico de investigação.
Harvey foi criticado severamente por sua ruptura com a filosofia Galênica. A Controvérsia sobre a circulação do sangue perdurou durante 20 anos, até que outors anatomistas finalmente repetissem as experiências de Harvey e concordaddem com sua descoberta.

Leeuwenhoek

Antoni van Leeuwenhoek (1632 – 1723) era um óptico holandês e polidor de lentes que aperfeiçoou o microscópio alcançando uma ampliação de 270 vezes. Suas muitas contribuições incluíram o desenvolvimento de técnicas para examinar tecidos e descrições de células sanguíneas, músculos esqueléticos e a lente do olho. Embora fosse o primeiro a descrever os espermatozóides com precisão, Leeuwenhoek não entendeu o papel deles na fertilização. De certo modo, ele pensou que um espermatozóide contivesse um ser humano em miniatura e o chamou de homúnculo.
O desenvolvimento do microscópio acrescentou uma dimensão inteiramente nova para a anatomia e conseqüentemente conduziu às explicações das funções do corpo e a um inestimável valor da etiologia de muitas doenças e assim, descobrir suas curas.

Anatomia no Século XIX

A principal contribuição do século XIX foi a formulação da teoria celular. Pode-se até discutir que esta teoria teria sido, a descoberta mais importante na história da biologia e da medicina porque todas as funções do corpo foram finalmente interpretadas como resultado da função celular.
O termo célula foi introduzido em 1665 por um médico inglês, Robert Hooke, quando examinava a estrutura da cortiça em seu microscópio na tentativa de explicar sua flutuabilidade. O que Hooke realmente observou forma as paredes rígidas que circundavam as cavidades vazias das células mortas. O significado da estrutura celular não se tornou evidente até aproximadamente 150 anos depois do trabalho de Hooke.
Com microscópios aperfeiçoados, pode-se observar melhor os detalhes. Em 1809, o zoologista francês Jean Lamarck observou uma substância semelhante a geléia no interior de uma célula viva e supôs que esse material seria mais importante que a estrutura externa à célula. Quinze anos depois, René H. Dutrochet descreveu as diferenças entre células de plantas e animais.
O princípio biológico da teoria celular foi creditado a dois cientistas alemães, Mathias Schleiden e Theodor Schwann.
Scheleiden, um botânico, sugeriu em 1838 que cada célula de planta leva uma vida dupla – ou seja, em alguns aspectos se comporta como um organismo independente, mas ao mesmo tempo coopera com as outras células que formam uma planta inteira.
Um ano depois, Schawnn, um zoologista, concluiu que todos os organismos estão compostos de células que são semelhantes na essência. Dezenove anos depois, a adição de outro princípio biológico parecia completar a constituição das células. Em 1858, o patologista alemão Rudolf Virchow escrevia um livro intitulado Patologia Celular no qual ele propunha que as células só poderiam surgir de células preexistentes. O mecanismo da replicação celular, contudo, continuou incompreendido por mais algumas décadas.

Anatomia no Século XX

As contribuições para a ciência anatômica durante o século XX não foram tão surpreendentes quanto o eram na época em que pouco se conhecia sobre a estrutura do corpo. O estudo da anatomia se desenvolveu cada vez mais através de especializações, e a pesquisa se tornou mais detalhada e mais complexa.
Uma inovação que ganhou impulso no início do século XX, foi a simplificação e padronização da nomenclatura. Por causa da proliferação da literatura científica no final do século XIX, mais de trinta mil termos para estruturas do corpo humano estavam registrados, muitos dos quais eram reduntantes. Em 1.895, em uma tentativa para reduzir a confusão, a Sociedade Anatômica Alemã compilou uma lista de aproximadamente 500 termos chamada de Basle Nomina Anatômica (BNA). Os termos desta lista foram aprovados universalmente para uso nas salas de aula e nas publicações.
Outras conferências sobre nomenclatura foram realizadas ao longo do século, nos Congressos Internacionais de Anatomia. No Sétimo Congresso Internacional na Cidade de Nova York em 1960, tomou-se a resolução de eliminar todos os epônimos (estruturas com nomes de cientistas) da terminologia da anatomia humana e substitui-los por nomes descritivos. Estruturas como o ducto de Stensen eo o ducto de Whartson, por exemplo, são agora corretamente chamados de ducto parótideo e ducto submandibular, respectivamente.
Como os epônimos estão tão enraizados, porém, será extremamente difícil eliminar todos eles da terminologia anatômica. Mas pelo menos, há uma tendência para a simplificação descritiva.
Em resposta ao avanço da tecnologia e da profundidade do conhecimento do século XX, novas disciplinas e novas especialidades surgiram na ciência da anatomia humana na tentativa de classificar e usar o conhecimento novo. As técnicas de tais disciplinas afins como química, física, eletrônica, matemática, e informática foram incorporadas na produção de pesquisas.
Há várias divisões bem definidas de anatomia humana. A mais antiga, claro, é a anatomia macroscópica, que é o estudo das estruturas do corpo que põem ser observadas a olho nu.
Também a anatomia de superfície que visa identificar superficialmente através de pontos de reparos do corpo as estruturas que podem ser observadas sob a pele ou podem ser palpadas.

Anatomia de Superfície

É surpreendente como muitas informações anatômicas podem ser obtidas pelo exame da anatomia de superfície de seu próprio corpo. A anatomia de superfície é o estudo das estruturas e dos pontos de reparo da superfície do corpo por inspeção visual ou palpação.
O conhecimento pela anatomia de superfície é clinicamente importante para localizar com precisão locais para percussão e ausculta.
Com exceção de certos ossos do crânio, os ossos do esqueleto inteiro podem ser palpados. Uma vez que a posição, a forma e os processos destes ossos são identificáveis, estas características do esqueleto podem servir como pontos de reparos para localizar outras estruturas anatômicas. Muitos músculos esqueléticos e suas fixações tendíneas são claramente visíveis quando contraídos e quando provocam movimento. A Localização e a amplitude do movimento das articulações do corpo podem ser determinadas quando os ossos que se articulam são movimentados através de contrações musculares. Em alguns indivíduos, as posições das veias superficiais podem ser localizadas e os seus trajetos, seguidos. Até mesmo a localização e função das valvas venosas dentro das veias podem ser demonstradas na superfície da pele. Algumas artérias também podem ser vistas pulsando sob a pele. Saber onde estão localizados os pontos de tomada de pressão arterial é um aspecto clínico importante da anatomia de superfície. Outras estrutuars podem ser identificadas na superfície do corpo, incluindo certos nervos, linfonodos, glândulas e outros e outros órgãos internos.
A anatomia de superfície é um aspecto essencial do estudo da anatomia para a Fisioterapia, disciplina que avalia previne e trata distúrbios relacionados a cinésie e a sistemas e órgãos de todo o corpo humano. Saber onde estão localizados os músculos e seus grupos pode ser extremamente importante na manutenção da capacidade física.
Na Fisioterapia, a anatomia de superfície de um paciente é de valor imensurável no diagnóstico e tratamento. Saber também onde tomar pulsação, introduzir tubos auscultar o funcionamento dos órgãos internos, tirar radiografia e realizar fisioterapia requer o conhecimento de pontos de reparo de superfície.
A eficiência da observação desse estudo está relacionado a quantidade de tecido adiposo subcutâneo em que o paciente apresenta. Examinando uma pessoa obesa, pode ser extremamente difícil observar ou palpar certas estruturas internas que são prontamente identificáveis em uma pessoa magra.

Nasce a Revolução na Anatomia

Frank H. Netter (1906-1991) nasceu na cidade de Nova York, estudou Artes na Art Student´s League e na National Academy of Design antes de ingressar na Escola de Medicina na New York University, onde recebeu seu grau M.D. em 1931. Durante seus anos como estudante, os esquemas dos cadernos de aulas do Dr. Netter atraíram a atenção da Faculdade de Medicina e de outros médicos, permitindo-lhe aumentar seu talento na ilustração de artigos e de livros-texto. Ele continuou com suas ilustrações como uma atividade paralela depois de estabelecer suas práticas cirúrgicas em 1933, mas finalmente optou comprometer-se em tempo integral com a arte.
Depois de servir no United States Army durante a Segunda Guerra Mundial, o Dr. Netter começou a sua longa colaboração com a CIBA Pharmaceutical Company (agora Novartis Pharmaceuticals). Essa parceria de 45 anos resultou na produção de uma extraordinária coleção de arte médica tão familiar aos médicos e a outros profissionais da medicina pelo mundo inteiro.
Os trabalhos do Dr. Neter estão entre os exemplos mais requintados do uso de ilustração no ensino de conceitos médicos. Os 13 livros da coleção Netter de ilustrações Médicas, que incluem a maior parte dos mais de 20 mil desenhos criados pelo Dr. Netter, tornaram-se e permanecem como um dos mais famosos trabalhos médicos já publicados. O Atlas de Anatomia Humana de Netter, publicado pela primeira vez em 1989, apresenta os desenhos anatômicos da Coleção Netter. Agora traduzido em 11 idiomas, ele é o Atlas de anatomia de escolha entre os estudantes de medicina e profissionais da área da saúde do mundo todo.
As ilustrações de Netter são apreciadas não somente por sua qualidade estética, mas, mais importante que isso, pelo seu conteúdo intelectual. Como o D. Netter escreveu em 1979: “...clareza do assunto é o alvo e a meta da ilustração. Pouco importa quão belos possam ser os desenhos, o quão delicado e sutilmente possa ser apresentada a matéria, isso será de pouco valor como ilustração médica se não servir para tornar mais claro algum ponto médico”.
O Planejamento, a concepção, o ponto de vista e a abordagem do Dr.Netter são as características de seus desenhos e o que os fazem tão valiosos intelectualmente.
Icon Learning System adquiriu a coleção Netter em julho de 2000 e continua até hoje com os desenhos originais do Dr. Netter, adicionando a ela novos desenhos encomendados a artistas treinados no estilo do Dr. Netter.

Frank H. Netter, MD., médico e artista, faleceu em 1991.
Esse site é dedicado à sua memória.